Blog do Renato Nalini

Ex-Secretário de Estado da Educação e Ex-Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo. Atual Presidente e Imortal da Academia Paulista de Letras. Membro da Academia Brasileira de Educação. É o Reitor da UniRegistral. Palestrante e conferencista. Professor Universitário. Autor de dezenas de Livros: “Ética da Magistratura”, “A Rebelião da Toga”, “Ética Ambiental”, entre outros títulos.


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INOVAÇÃO: UM BLEFE?

Já escrevi mais de uma vez que neste universo da 4ª Revolução Industrial, quem não inovar perecerá. É que tudo está sob suspeita de anacronismo e superação. Ninguém mais acredita na Democracia Representativa, pois quem consegue representar outrem na sordidez da conduta política de nossos tempos?

Velhas fórmulas já não convencem e o mundo está sequioso de uma alternativa de salvação. Salvação da Terra, tão cruelmente golpeada pela insensatez de quem não percebe que ela é ainda o nosso único habitat. Salvação do convívio, fragilizado por relações superficiais, egoísticas e interesseiras, que amedrontam quem espera encontrar, senão amor, ao menos respeito no trato com o semelhante.

Todavia, não sou resistente a revisitar minhas posições e confesso que os livros de Benoit Godin, pensador canadense do INRS – Institut National de la Recherche Scientifique de Montreal me fizeram pensar. Ele escreveu “Innovation Contested” e “Models of Innovation” (Inovação contestada e modelos de inovação, em tradução livre).

Para ele, inovação é um movimento com fixação na busca pela liberdade e por isso fascina a criatura humana. Os que a praticam em regra introduzem algo diferente em uma sociedade petrificada nos costumes. Mas a inovação não se restringe ao âmbito tecnológico, sentido pelo qual é mais citada em nossos dias. Ela possui um âmbito religioso e político. No primeiro sentido, equivalia a “heresia”. Sua característica é criar um conflito entre a tradição e a novidade, o que prejudicou o sentido positivo de inovação até meados do século XX. Nesse momento ela se tornou a moda e a mania.

Da Idade Média e da Renascença, em que era tão combatida como a “Peste Negra”, até tornar-se a queridinha dos criadores de startups, a panaceia inovadora não passa de um modelo provisório. Tende a ser substituída por outra inovação e, na era consumista em que fomos arremessados, o descarte é o resultado nunca inesperado para as novidades.

Quem acredita na perfectibilidade humana e na escala ascensional do aprimoramento da espécie a cada nova geração, não terá dificuldade em crer também que o ideal será o equilíbrio entre tradição e inovação, para que não se percam parâmetros, valores e, talvez, o próprio conceito de “alma”.

José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, docente universitário, palestrante e conferencista.

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TRANSPARÊNCIA OU ANONIMATO?

A Constituição Cidadã de 1988 abriga inúmeros antagonismos. Princípios colidentes, que se agridem e que dificilmente são conciliáveis. É o que acontece, por exemplo, com a privacidade ou intimidade e a publicidade ou transparência.

O meu “feeling” é o de que a privacidade perdeu de lavada. Sob argumento de que a segurança é mais importante do que proteger a intimidade, a transparência atingiu um paroxismo inédito. O medo do terrorismo identifica populações inteiras em regimes fortes. Isso só não chegou ao Brasil com intensidade idêntica, porque para isso faltam recursos. Mas a tecnologia já se encontra disponível.

E o que pensa disso a nova geração? Há os que pensam que ela não pensa. Há os que parecem concluir que ela aderiu à super-exposição. Escancara sua vida com as redes sociais que distribuem pelo mundo as fotos de suas viagens, mas também de seus passeios, de seus pratos preferidos, de tudo aquilo que fazem, sentem, gostam ou desgostam.

A imersão nas redes sociais tem sugerido algumas reflexões. Emma Hope Alwwod, editora do site da revista Dazed, uma das mais influentes, escreveu um desabafo sob o título “O Lado Negro das Mídias Sociais”. Estas são um “mar de ilusões” e uma armadilha que define e sufoca os millennials. Hoje, você é o que você posta. A imagem social é uma construção que paralisa, traz ansiedade e frustração.

O Brasil ainda está nessa onda. Dependência total da internet. Depressão quando não se recebe um whatsApp. Neura total quando, por algum motivo, se está sem o mobile.

Já nos Estados Unidos, uma pesquisa realizada pela Box1824, agência e consultoria de tendências, fez um trabalho de campo em sete estados dos EUA com jovens de 18 a 24 anos. A notícia é de Ronaldo Lemos, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro – ITS-Rio. A constatação é a de que esta faixa tem relação diferente com as mídias sociais. A chamada “GenExit”, geração saída, é assim batizada porque procura uma saída para essa desesperante dependência.

Sua característica: o abandono dos perfis públicos e a opção por contas privadas. Postagens efêmeras, que desaparecem após visualizadas. É uma geração mais realista, que sabe que a possibilidade de ascensão social, de ter emprego ou estabilidade é reduzida. E de tal insegurança vem um apreço pelo anonimato, pela construção de identidades fluidas, sempre aberta a começar de novo, em algo novo e em qualquer momento.

Seria uma geração que consome menos álcool, trabalha mais, usa menos drogas e faz menos sexo. Tem expectativas menores, compartilha o estado de desilusão com o mundo e desconfia da internet e das redes sociais. Essa geração ditará o nosso amanhã. Tomara que encontre o rumo e tenha sorte.

*José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, docente universitário, palestrante e conferencista.

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RUMO À CIDADANIA DIGITAL

A criança precisa ser treinada desde cedo a se tornar uma “cidadã digital” com redução dos riscos a que estaria sujeita sem essa peculiar educação. Quanto mais cedo ela aprender a não praticar violência online, ela também se tornará mais resistente a ser vítima de violência. Mas também a ter autocontrole para não ficar dependente e agir com responsabilidade nas redes sociais.

Existe um instituto de educação digital que é presidido pela coreana Yuhyun Park, formada na Universidade de Harvard e chamado DQ Institute. Para ela, as competências digitais devem estar nos currículos das escolas de todos os países e desde os anos iniciais.

Não é suficiente impor horário para uso do celular, como alguns pais já fazem. Pesquisas mostram que mais da metade das crianças de 8 a 12 anos no mudo estão expostas aos riscos do mundo digital. Dentre eles, a exposição à pornografia, a conteúdos violentos ou a vícios em jogos. Quando as crianças têm seu próprio celular – e isso está virando moda até mesmo entre estamentos hipossuficientes – esse risco aumenta em 20%.

A criança do século XXI tem de ter inteligência digital, conjunto de competências para lidar com o mundo das redes. Para isso, devem ser educados de forma completamente diversa da qual o foram até hoje. A educação digital é uma ferramenta pedagógica, apta a ensinar, cientificamente, como limitar o tempo na frente das telas. É suficiente mostrar o quanto isso afeta o cérebro, o corpo ou as habilidades cognitivas.

O bullying foi potencializado pelas redes, pois aquilo que poderia permanecer num círculo restrito, até íntimo, entre algoz e vítima, em geral viraliza e ganha dimensão incrível. A criança precisa saber que ao inserir algo na internet, isso permanecerá lá para sempre. É o passado virando presente e atormentando pessoas que nem sempre conseguem escapar da depressão, do estresse e até do suicídio.

Para a especialista, a criança não deve frequentar as redes sociais pois é ingênua e está vulnerável à ação nefasta de adultos perversos e até portadores de taras. Há tempo para mergulhar nesse mundo sem volta. Mas o cuidado quem tem de tomar é a família. Pais e mães, ou responsáveis, devem ser francos. Sem impedir que a cidadania digital se instale por todo o globo. Esse encontro é inevitável.

José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, escritor e jornalista, conferencista e palestrante.

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RIDENDO, CASTIGAT MORES!

Esta expressão latina é plena de significado. Mostra que o humor é uma ferramenta útil para falar as verdades que a franqueza não ousaria. Algo assim como o papel reservado aos “bobos da Corte”, que podiam abusar sem receio de punição, tudo justificável ante sua presumida inimputabilidade.

O Brasil criou uma tradição interessante nas “charges” que percorrem itinerários vedados à crítica escrita. Quem se detiver a consultar um retrospecto da produção dos chargistas no decorrer dos anos terá uma reconstituição bem interessante da História Pátria. A criatividade de nossos quadrinistas, caricaturistas ou chargistas é formidável.

Muitas vezes me servi das charges para propor exercícios de aferição do aproveitamento do alunado em aulas de Ética ou de Filosofia do Direito. Com resultados bem instigantes. O meu preferido sempre foi Angeli, que militou durante muitos anos na Folha de São Paulo.

Mas recentemente encontrei seis quadrinhos elaborados por Ricardo Coimbra, na penúltima página da “Ilustrada” de 11.6.2018, que é um excelente testemunho dos dias que nos foram reservados nesta triste temporada.

Sob o título “Gentrificação de Precariedade”, o primeiro quadrinho estampa uma pobre mulher acendendo o fogão à lenha, com seus filhinhos hipossuficientes, enquanto a jornalista noticia: “E, com a alta do gás, o povo redescobre o charme vintage de cozinhar com lenha”. No segundo quadrinho, o repórter fala ao microfone: “Sem gasolina e a pé, paulistano passa a fazer turismo no próprio bairro”. A figura é de um irritado trabalhador de terno e gravata caminhando com sua pasta 007.

Na terceira charge, o apresentador diz: “Com o desemprego, cresce cada vez mais o número de empreendedores!”. E o trabalhador informal consulta: “Vai graxa aí, moço?”. Na quarta, o âncora de TV anuncia: “Com a modernização da CLT, surge uma nova modalidade de emprego: o home office presencial”. O funcionário, na repartição, pergunta: “Tenho que trazer meu próprio computador pro escritório?”.

O quinto desenho é o de uma coletividade difusa de pessoas se espremendo em reduzido espaço, sob o anúncio da entrevistadora: “Com o orçamento apertado, brasileiros adotam o “co-living”, enquanto é corrigido por um morador: “É república que chama, moça!”. Finalmente, diante de um mendigo com a mão estendida em busca de esmola, a sexta charge, sob a vista impassível do homem de TV: “De olho na boa forma, cada vez mais o brasileiro adere à dieta low carb”!

É um eloquente testemunho do que a passiva, resignada e sofrida população brasileira atravessa nestes tempos de consolidada descrença na representação político-partidária e do desaparecimento da esperança em dias melhores.

José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, escritor e jornalista, conferencista e palestrante.

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O CUSTO DA MORTE

Uma vida é um valor incalculável. Indague-se a um pai, a uma mãe, qual a indenização adequada pela morte de um filho. Mas para o Brasil, a morte de um jovem tem um custo quantificado. Cada jovem morto faz o país perder R$ 550 mil. Em 20 anos, o prejuízo acumulado foi superior a R$ 450 bilhões. Essa a conclusão de um estudo realizado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos da União Federal.

O cálculo leva em consideração a perda da força produtiva, ou seja, quanto o Brasil deixa de ganhar com os frutos que o trabalho de cada vítima renderia. Também mensurou os gastos do setor público e privado em seis áreas: segurança, seguros e danos materiais, custos judiciais, perda da capacidade produtiva, encarceramento e serviços médicos e terapêuticos.

Só no ano de 2015, a criminalidade custou 4,38% do PIB brasileiro, a quantia nada desprezível de R$ 285 bilhões. Não se deixou de investir em segurança pública. De 1996 a 2015, os recursos cresceram 162%. Mas a criminalidade caminhou na mesma proporção. Isso significa que a organização criminosa é muito mais eficiente do que o Estado.

Numa entrevista na Globo News, o Secretário de Assuntos Estratégicos Hussein Kalout demonstrou conhecer a área e não teve tempo de explicar a Monica Valdvogel que a questão não é ampliar ainda mais o número de vagas no sistema prisional.

Pouca gente consegue entender que prendemos muito e prendemos mal. Somos já o terceiro país do mundo em número de prisões, só depois dos Estados Unidos e da China. Ultrapassamos a Índia, cuja população é muito maior do que a nossa.

A prisão é a pior das opções como punição para a criminalidade. Mas é parece a única para o Brasil. Para a faixa de corruptos e fraudadores que saqueia o Brasil, o maior castigo é reaver o dinheiro do povo. Fazê-los devolver as cifras astronômicas utilizadas para enriquecimento próprio. Prisão é “refresco”, como o povo diz. Mordomias, viagens de avião, esquema de segurança milionário. Mais sangria para o povo.

O pequeno usuário de droga não pode ir para a prisão. Ali, onde o Estado é o repressor, as facções são a salvação. Ele é recrutado para a profissão de delinquente. Nunca mais deixará esse ambiente.

Vamos copiar o que há de bom nos outros países. Punir sim, mas de forma pedagógica e sem onerar a população que é a maior vítima do criminoso, mas também de um Estado apalermado e que não sabe oferecer segurança, embora seja muito competente para gastar dinheiro do povo.

José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, escritor e jornalista, conferencista e palestrante.

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DAR CHANCE À INTELIGÊNCIA

O Brasil parece anestesiado e inerte ante ao que ocorre no planeta. Enquanto outros Países superam dificuldades muito superiores às nossas e levam a sério a educação, aqui prevalece a mesmice. Não se concede espaço para a criatividade e para a audácia. Tudo tem de ser normatizado, regulamentado, definido na teia de exigências formais que a tudo sufoca. Inclusive a inovação, sem a qual o País não caminhará rumo ao amanhã.

Não é por falta de incentivo. Se levasse a sério a inovação, o Brasil poderia mudar o cenário de desalento entre cinco e dez anos. Quem afirma é a Diretora Executiva do MIT – o Massachusetts Institute of Technology, onde comanda o IPC-Industrial Performance Center. Ela veio trazer um pouco de ânimo a um dos setores que há muito tempo descobriu que o figurino da educação formal é insuficiente para enfrentar os desafios da vida real. O SENAI, um dos eixos do fabuloso sistema “S”, que é a resposta de quem sabe o que é trabalho – muito diferente de uma Administração Pública rançosa e costumeiramente distribuída em fatias entre os apaniguados.

O MIT desenvolveu um projeto de pesquisa para acelerar a inovação no Brasil. Para isso, é preciso aumentar a integração do País com o mundo. Não fazendo com que nossas melhores inteligências migrem para outros espaços onde elas são reconhecidas. Mas flexibilizando as regras locais, um caótico sistema de proibições, para facilitar o acesso a centros de inovação internacionais.

De acordo com a especialista, “a regulamentação é asfixiante”. Os bons exemplos – raríssimos – são aqueles em que o Poder Público não pode interferir, como a FAPESP, ora sob o comando de uma figura notável, o Professor José Goldemberg, que já esteve também subordinada a outra legenda pátria, o Ministro Celso Lafer. São essas as pessoas que podem ajudar o Brasil a sair do lodaçal medíocre e que enfrentam dificuldades, a partir da miopia estatal, evidente fator de empecilho à desenvoltura que seu esforço poderia obter.

As três condições para o Brasil inovar, diz Fernanda Negri, pesquisadora do IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, são pessoas qualificadas, infraestrutura adequada e ambiente de incentivo ao empreendedorismo. Todas elas ainda carentes e debilitadas, porque o Governo está mais preocupado em se preservar, em eleições e em agenda que só interessa a quem não acredita em renovação. E se assim está bom para quem manda, por que inovar?

José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, escritor e jornalista, conferencista e palestrante.

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EDUCAÇÃO: O DESAFIO É MUITO MAIOR

Não causou surpresa para quem é atento, a notícia de que todas as escolas poderiam oferecer melhor performance no ENEM, o exame nacional do ensino médio. Em termos de aproveitamento do ensino, ou seja, de aprendizado, caminham deficitariamente tanto as públicas como as particulares.

A que se deve o insucesso? À falta de estrutura material? Não pode ser, porque há unidades de ensino sofisticadas, com tudo aquilo que a tecnologia pode propiciar ao seu cliente, o aluno. Ao despreparo do pessoal? Não. Há excelentes professores tanto na educação do governo como na escola paga, de escolha dos pais dos alunos.

O que explica o resultado pífio?

Surgirão inúmeras versões, pois assim como no futebol e na medicina, o brasileiro se especializou e todos têm a chance de opinar. Também entro nesse terreno, como alguém que tentou investir no sistema e sentiu na pele e na consciência a gravidade do problema.

A escola brasileira está ultrapassada. Raríssimas as exceções ao universo da mesmice, do trilhar os mesmos caminhos, na cegueira que não vê o mundo mudar, na surdez de quem não ouve o clamor do alunado.

Ninguém mais suporta a aula prelecional, mera repetição de conteúdo que pode ser encontrado na web de maneira muito mais atraente e atualizada do que a oferecida ao estudante. Ele ainda se enfileira, sentando-se um atrás do outro. A não ser a turma do “gargarejo”, os demais enxergam em primeiro plano a nunca do colega à sua frente.

Como se interessar por uma aula oral, se o mundo fantástico das redes sociais propicia percorrer o mundo e suas fantasias, se o Google responde em segundos a qualquer questão, se os exemplos que o mundo do consumo oferecem não correspondem ao sonho de uma juventude imersa na 4ª Revolução Industrial?

Fica difícil convencer o jovem de que só o estudo lhe abrirá as portas do êxito profissional, quando Steve Jobs, Marck Zuckeberg e outros tantos vencedores foram péssimos alunos, nenhum deles conseguiu obter o termo final da escolarização formal.

A escola não segura o jovem, porque é desinteressante, chata, insossa e não consegue comprovar que o conteúdo do ensino importará na busca incessante pela felicidade.

O educador é aquele que enxerga em cada educando uma individualidade que mereceria atenção exclusiva, ouvidos prontos para escutar as angústias, controlar a ansiedade, atenção carinhosa para saber que não é fazendo com que o aluno decore uma série de informações que a escola o tornará alguém mais feliz.

Por óbvio, não existe aquela felicidade ideal, a utopia que acalenta a maior parte da humanidade e que a faz prosseguir, mesmo diante de tantos desatinos. Mas tentar identificar as suas inclinações, aquilo que lhe dá prazer e aquilo que irrita profundamente o seu âmago, tudo isso parece não fazer parte de uma educação mais preocupada com rankings, com avaliações, com a mensuração que seria o atestado do êxito no empreendimento.

Educar, se levado a sério, tornaria o Brasil o paraíso que os portugueses acreditaram haver descoberto em 1500. A terra dadivosa, em que se plantando tudo dá. Mas a terra que, entregue à sanha insensível de uma elite gananciosa e ignorante, destrói rapidamente o seu patrimônio natural. E nessa empreitada bem sucedida, assassina também a ilusão de uma juventude que só recebe mensagens preordenadas a torna-lo um bom consumidor. Alguém que vai procurar saciar seu desencanto comprando o mobile de última geração. Usando a roupa de grife da última temporada. Berrando no show da atração internacional que se digna aparecer nesta terra para uma noitada cujo ingresso tem o custo equivalente ao salário mínimo. E que não desanima aqueles que permanecem na fila dias antes, só para urrar e dizer que está na moda e que sabe o que é bom lá fora.

Li recentemente que o MEC deveria ser extinto, artigo de um ex-Ministro. E que a lei do Currículo do Ensino Médio deveria ser revogada, em texto assinado por ex-Secretário. Pessoas que conhecem as entranhas da Administração Pública. Mas não vejo a manifestação de famílias, de associações de pais e mestres, de ONGs, de instituições que deveriam se empenhar em prover a República de gente lúcida e decente.

Enquanto  não se perceber que o que falta ao Brasil é vergonha, é brio, é caráter, é a tão decantada ética, patriotismo, amor à família, à terra e à História, não se conseguirá formar uma geração capaz de mudar o triste e sombrio panorama deste continente heterogêneo, que só tem como núcleo comum o desalento e a falta de perspectivas, tamanha a insensatez predominante nas mais elevadas esferas.

José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, escritor e jornalista, conferencista e palestrante.

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COMO EXPLICAR?

Flagrante, no Brasil, o desencanto das pessoas de bem com a política partidária. Mentira, desmandos, corrupção, tudo parece continuar, a despeito do protagonismo da Lava Jato. Parece não haver restado superfície hígida no tecido putrefato da administração pública em todos os níveis.

A despeito de tudo, é preciso confiar na Democracia. Agarrar-se às explicações esfarrapadas de que somos um país jovem, de que há muito a aprender e que as novas gerações não podem ser desiludidas.

Não se formulou uma formatação nova para o exercício do poder. Ainda necessitamos de ordem, de força, de disciplina, de regras. E é melhor que isso provenha de uma estrutura o quão democrática se possa erigir. A alternativa de força já foi experimentada e não funcionou aqui, assim como não funciona em outras partes do planeta.

O remédio é fazer com que a juventude – principalmente esta, que não tem motivos para se orgulhar de sua representação política – participe das eleições. Em lugar de votar em branco ou nulo, escolher quem considera bom ou o menos pior. Não aproveitar o domingo das eleições para ir à praia, mas exercer o sufrágio. Participar. Assumir responsabilidade. Tentar influenciar no angustiante processo de gerir a coisa pública.

Mas resta invocar o que resta de consciência para os candidatos e pedir que eles esclareçam os pontos mais críticos do atual processo eleitoral. Como justificar a existência de quase 40 partidos? Como assimilar o esforço dos candidatos para atrair siglas cujos próceres são pessoas execradas por seu passado remoto ou recente, tudo em troca de alguns segundos ou minutos de propaganda gratuita? Como fazer o jovem crer que não haverá “pedágio” mais adiante, com o vencedor tendo de vender a alma para satisfazer os fisiológicos que aderiram a ele?

Como aceitar a urgência de proceder às reformas de base, as modificações estruturais de um Estado falido, que trabalha com a perspectiva de 300 bilhões de déficit, que não terá condições de pagar aposentados e pensionistas, que não tem um tostão para investimento e que não leva a sério o compromisso com a educação?

Não está fácil convencer o eleitorado lúcido em 2018. Os cientistas políticos acenam com o grau de mentira que levará o candidato ao segundo turno e à vitória. Mas reconhecer que eleição é falácia é algo muito triste para uma Pátria que aspirou ser justa, fraterna e solidária.

José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, escritor e jornalista, conferencista e palestrante.

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MORTE POR ATACADO

Não bastassem as 60 mil mortes de jovens a cada ano, o Brasil agora quer obter promoção em novo ranking: a mortalidade infantil. O índice estava em queda desde 1990, mas subiu em 2016 e continua em escala ascendente em 2017.

Em 1990 a taxa de mortalidade infantil – número de crianças mortas até um ano para cada mil nascidas vivas – era de 47,1. Desde então e até 2015, houve redução na mortandade. Neste ano foi de 13,3 óbitos por mil bebês. Em 2016, começou a subir novamente: 14 crianças não chegam a um ano de idade, para cada mil nascidos com vida.

De 1990 a 2015, a queda foi de 71,7% e em 2016, subiu 4,8%. Tudo indica subida também em 2017. Enquanto isso, em 2018 já se contabiliza 21 mil mortos violentamente no primeiro semestre. Entre jovens e crianças, continua o morticínio. Sem falar nos milhares de abortos – são vidas sacrificadas por quem não quer ver nascer a criatura por ela gerada – , nas balas perdidas, nos acidentes de trânsito, na faixa etária excluída da divulgação.

O que significa esse quadro tétrico?

Primeiro, falta de educação. Educação de qualidade é a mais valiosa estratégia de transformação existencial do ser humano. Muitas dessas mortes derivam de ignorância das mães adolescentes, da falta de cuidados, do despreparo. Mas há também falha estatal: assistência pré-natal, ausência de saneamento básico, falta de vacinação.

Mais um retrocesso no País que acaba com as florestas, polui suas águas, compromete sua atmosfera, emporcalha seu território.

Uma lástima para quem já foi bem melhor em tempos idos, quando havia respeito aos valores, honrava-se a vida humana, respeitava-se o padrão de higiene, de cuidados em relação à gestante, à parturiente, ao nascituro e ao infante que vinha à luz em Pátria com vocação para um elevado grau civilizatório.

Há omissão generalizada: do governo, mas também da cidadania. Esta é a responsável pelas más escolhas. Não se interessa pela fiscalização dos gastos públicos, não cobra, não exige conduta compatível com o Estado de Direito de índole democrática.

Quem paga, infelizmente, é a infância inocente, que cede o seu destino para engrossar estatísticas de desgraças de nação subdesenvolvida.

José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, escritor e jornalista, conferencista e palestrante.

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POVO DEVE ASSUMIR PROTAGONISMO

Na sequência de desgraças que a mídia dissemina, em seu papel de mostrar o que choca e de zelar pela continuidade do desalento, vem de Goiás um bom exemplo.

Em três municípios, a população, liderada pelo Juiz, Promotor e lideranças locais, construiu presídios que não resultaram da conhecida ineficiência do governo.

Não se entre na discussão que se faz necessária, sobre a preponderância da prisão como punição ao delinquente. Cadeia não resolve e nem recupera o prisioneiro. O cárcere é uma pós-graduação em criminalidade. E custa caro à população. Ela não tem noção do quanto!

Mas o gesto é significativo. Mostra uma vereda que precisaria intensificação em outros setores. Tudo o que o Governo faz é mais demorado, mais dispendioso, menos eficiente e a presunção de que existe corrupção não se dissipa. Ao contrário: a cada dia se mostra mais provável, pois a Lava Jato não desestimula quem tem certeza da impunidade. As técnicas malandras se sofisticam e se tornam a cada dia mais frequentes.

Quando juízes e promotores percebem que o Estado não consegue oferecer as vagas prisionais necessárias e a população se convence de que a principal prejudicada é ela mesma, a solução não é impossível. Quando o dono do dinheiro – o povo – assume o controle da edificação, esta é mais confiável. Segundo se noticiou, menos de um ano foi necessário para ultimar a primeira prisão. Se estivesse a cargo da Administração Pública, talvez a obra não tivesse passado pela fase burocrática da licitação.

Se o povo perceber a força que tem e a sua obrigação de não permitir que seu dinheiro, – sacrificado e suado, já que resulta da maior carga tributária do mundo – seja dilapidado, as coisas poderão melhorar no Brasil. Assim deveria ser com tudo aquilo que ele puder fazer por sua própria iniciativa. Escolas, asilos, centros de convivência, praças, abrigos, tudo o que se mostrar adequado a aprimorar a qualidade de vida de uma população espoliada, enganada e, por isso mesmo, descrente de tudo.

Não custa lembrar: governo é instrumento, é ferramenta, é encargo. O governante é servo do povo. O único detentor da soberania é o povo. Este é que precisa fazer valer aquilo que está explícito na Constituição da República: todo o poder emana do povo. Goiás mostrou que isso é possível. Por que não em outros lugares?

JOSÉ RENATO NALINI é desembargador, reitor da Uniregistral, escritor, palestrante e conferencista.

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