Uma polêmica artificial é aquela gerada entre os que sustentam o criacionismo e os que seguem o darwinismo exacerbado. Ou seja: entre os que acreditam que o Universo é fruto de um design inteligente, cujo autor se chama Deus ou qualquer outro nome possa merecer e aqueles que atribuem a vida a uma grande explosão: o Big Bang. Penso que a discussão é artificial porque o criacionismo não descarta o evolucionismo. Fé sem razão tende ao fanatismo, enquanto que razão sem fé não explica o sentido último da aventura humana. A fé precisa da ciência, como a ciência precisa da fé.
O sociólogo britânico Steve Fuller, recentemente entrevistado, trouxe alguns argumentos interessantes para a reflexão. Comentou ele a proibição, nas escolas da Inglaterra, a que os professores lessem um singelo comunicado no sentido de que o darwinismo não é a única explicação para o surgimento da vida no planeta. Complementavam que a biblioteca do colégio dispunha de livros contendo outras teses e que estes se encontravam à disposição dos interessados.
Uma espécie de fundamentalismo inspirou essa vedação. Por que impor ao alunado uma única tese, se esta não é a exclusiva explicação para o surgimento da vida na Terra? O pensador Steve Fuller perfilha o criacionismo. Trouxe outros argumentos para reforço dessa opção. Eles são ponderáveis. Se o homem é a conjugação de fenômenos naturais ocorridos neste planeta, não parece insólito que suas preocupações ultrapassem os lindes terrenos? Como justificar o anseio cósmico desta criatura frágil – o caniço pensante – propensa a desvendar os segredos do Universo, do Cosmos, o enigma da vida, temas muito além daquilo que guardaria pertinência com um ser vivente originado nesse pequeníssimo planeta?
Só a inserção da consciência humana num grande projeto, naquilo que é hoje conhecido como design inteligente é que autorizaria concluir a superação dos limites da criatura considerada racional. O darwinismo que não admite a intervenção de Alguém fora da esfera humana ao traçar os destinos da humanidade precisaria fornecer outra resposta para a presente indagação. Como é que a vida surgida por acaso numa pequena esfera de um universo infinito nutriria essa vocação à infinitude?
Reflexo de que a alma humana possui algo de indefinível, inexplicável e que não pode ser traduzido em linguagem circunscrita aos que se satisfazem com o Big Bang. Como se um grande quebra-cabeças, de 5 mil peças, ao ser arremessado aleatoriamente para o alto, caísse de forma a recompor o desenho de que se originou e isso pudesse vir a ser atribuído ao acaso.
José Renato Nalini é Desembargador da Câmara Especial do Meio Ambiente do Tribunal de Justiça de São Paulo e autor de “Ética Ambiental”, editora Millennium. E-mail: jrenatonalini@uol.com.br.