Blog do Renato Nalini

Ex-Secretário de Estado da Educação e Ex-Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo. Atual Presidente e Imortal da Academia Paulista de Letras. Membro da Academia Brasileira de Educação. É o Reitor da UniRegistral. Palestrante e conferencista. Professor Universitário. Autor de dezenas de Livros: “Ética da Magistratura”, “A Rebelião da Toga”, “Ética Ambiental”, entre outros títulos.


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A AUTOMAÇÃO ROUBARÁ SEU EMPREGO?

            Já não deve surpreender ninguém que o amanhã será um deserto de empregos. Mas não de atividades. Estas surgirão e demandarão pessoas qualificadas para exercê-las. O autor do livro “Um Mundo Sem Trabalho”, Daniel Susskind, constatou que a pandemia acelerou a automação. Aquilo que era projeto passou a ser realidade.

            Para o pesquisador de Oxford, há duas automações. Aquela que substitui ação humana e que já existe há muito, sobretudo na indústria e agricultura e a fracionada, que apenas interfere em uma parte da atividade submetida ao ser pensante. Avalia-se que 60% das profissões formais têm elevado potencial de automação até 2026.

            O interessante é que nem tudo pode ser automatizado. Invoca-se o chamado paradoxo de Moravec, formulação do austríaco Hans Moravec, nos anos 1980. Indagado sobre as profissões que estariam livres de serem automatizadas, ele respondeu: “Tarefas que achamos complicadas são facilmente resolvidas por máquinas e as que achamos simples, os computadores não conseguem resolver”. Por isso estão em alta as profissões de enfermeiros, cuidadores, nutricionistas, terapeutas, isso para falar na urgência de se manter uma estrutura de saúde compatível com os riscos da pós-modernidade.

            Mas outros espaços também necessitam de pessoas. O mundo maltratado pelos devastadores da natureza precisará de pessoas que coletem sementes, que façam mudas, que mantenham viveiros. Que incentivem crianças a um constante replantio do verde que foi exterminado, da recomposição das matas ciliares, da utilização de qualquer terreno ocioso para abrigar hortas, pomares e conjuntos de árvores. Estas são fundamentais para a preservação da higidez climática e para a saúde humana. Enquanto a criminalidade destrói a Amazônia, o Pantanal, o Cerrado e a Mata Atlântica, é um refúgio da esperança fazer com que as crianças se mantenham amigas do ambiente.

            O globo será o ambiente dos idosos. Estes precisarão de companhia, de academias para treino, de lazer e entretenimento. Também haverá muitas anomalias mentais. Cresce a necessidade de psiquiatras, psicanalistas, psicólogos, terapeutas para casais e para solitários. Se a tendência à extinção de empregos se concretizar e sobrevier a renda mínima, será preciso criar esquemas de acompanhamento dos que não terão o que fazer. O trabalho não é apenas castigo, mas é fonte de diversão, para quem gosta do que faz. Como cuidar daqueles que têm com que viver, mas não têm o que fazer com suas vidas?

            A educação no século 21 tem de acordar para investir nas habilidades socioemocionais. A inteligência artificial é poderosa e sábia. Mas não é suscetível de emoção. Aquilo que necessitar de sensibilidade, empatia, ternura, emoção, nunca será objeto de funcionamento de máquina. A ferramenta da consciência ainda é insubstituível. Ao menos por enquanto.

            Segundo os estudiosos, algo que pode ser imediatamente automatizado é o atendimento do tipo call center. Meios eletrônicos tais como WhatsApp ou chatbots (conversa com robôs), dispensam a presença de um humano para atender às solicitações mais corriqueiras. Também tendem a desaparecer, gradual e lentamente, as aulas prelecionais. O professor que tem de repetir suas aulas infinitas vezes, pode fornecer um conteúdo digital que vai satisfazer a muitos discípulos. Ele será quase que um professor particular, para responder às dúvidas, para orientar e para tutorar o educando.

            Em compensação, haverá a necessidade de novos profissionais como especialista em serviços sanitários. É aquela pessoa que zelará e garantirá a qualidade de um ambiente inteiramente livre de vírus e insuscetível de causar eventuais infecções. É algo com que todos deverão se preocupar de hoje em diante.

            Outra profissão em alta é o “coach”, o profissional habilitado a capacitar outros nas competências comportamentais, também chamadas “soft skills”. O coach será muito requisitado no futuro próximo.

            Também se indica o especialista em Tecnologia da Informação sob demanda. Todos estão mergulhados no mundo web e vão precisar, cada vez mais, de profissionais que virão a domicílio resolver problemas pontuais, de conectividade, de estrutura tecnológica, de tudo aquilo que é novidade e surpresa na vida digital.

            Com a necessidade de se reverter a onda de extermínio da natureza, todas as profissões vinculadas ao mercado verde também serão muito bem vindas. A ecologia não é mais um saber sofisticado e desnecessário, cultivado por fundamentalistas ambientais. É algo de que depende o futuro da humanidade. Por isso é urgente recrutar jardineiros, agrônomos, técnicos em agricultura, engenheiros florestais, floricultores, paisagistas, especialistas em orquidários, cultores de hortas orgânicas, formadores de pomares, de hortas, de aproveitamento de qualquer terra e revitalizadores de solo extenuado.

            O mundo terá de ser outro, ou, simplesmente, não será… É de se recordar a profecia de Mikhail Gorbatchev quando esteve na ECO92, de saudosa memória: “O ser humano tem trinta anos para mudar seus hábitos de consumo e de conduta. Depois disso, a Terra continuará a existir. Mas prescindirá da espécie humana para isso!”.

            Pode ser que isso não aconteça. Mas ninguém pode garantir que isso deixe de acontecer.

            Quantos anos faltam para que esse lapso ocorra?    

_ José Renato Nalini é Reitor da UNIREGISTRAL, docente da Pós-graduação da UNINOVE e Presidente da ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS – 2019-2020.

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A DESIMPORTÂNCIA DA ÉTICA

            Ética, reitero como voz a clamar no deserto, é a única matéria-prima em falta neste Brasil onde tudo sobra. A ciência do comportamento moral do homem na sociedade é a baliza segura para que o convívio deixe de ser a luta livre em que todos se devoram.

            Lamentavelmente, o estudo da ética foi praticamente abandonado. É pouco dizer que foi apenas negligenciado. Os poucos adeptos a essa religião moral falam para si mesmos. Ou têm de formular artifícios para serem ouvidos, pois a menção ao verbete “ética” afugenta raros ouvintes.

            O universo em que ela deveria estar mais entranhada, é aquele que reflete, emblematicamente, a falta que ela faz. O Brasil em que proliferaram as Faculdades de Direito, a ponto de possuir – sozinho – mais unidades do que a soma de todas as outras existentes no restante do planeta, ainda tem a ética no discurso, mas a despreza na prática.

            Os recorrentes exemplos de conduta bizarra no âmbito dos Tribunais são consequência direta e imediata da falta de noção do que seja a ética. Já houve tempos mais favoráveis à consideração que tal ciência deve merecer.      Recordo-me da atuação do saudoso Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, fervoroso líder na implementação da grande ideia das Escolas da Magistratura, ao inserir o tema ética em todos os incontáveis eventos que promoveu.

            Insistia na urgência de um Código de Ética da Magistratura Nacional, que foi editado pelo Conselho Nacional de Justiça em 2008 e que prevê a entrega de um exemplar de seu conteúdo a cada novo juiz. Prática de cuja efetividade não tenho notícias.

            A Escola Paulista da Magistratura, criada no mesmo ano da Constituição Cidadã, contava em seus primórdios com um núcleo deontológico. O primeiro curso promovido para os magistrados resultou em livro com textos de vários dos expositores e que, durante alguns anos, foi referência para os candidatos a concursos de Ingresso à carreira.

            Com o passar dos anos, a ética saiu de moda. Justamente quando ela se mostra mais necessária. A tônica é a técnica. Prodigalizam-se estudos sobre o direito instrumental. Todas as novas leis são objeto de detida análise e variegada leitura. A ética foi para os subterrâneos do interesse institucional.

            Contudo, dir-se-á que o Brasil é hoje mais ético? O direito tem sido aplicado de forma ética? Ainda se pode falar em “mínimo ético” no espaço jurídico?

            Haverá condição para a reabilitação do refletir moral, para recuperar a ideia de que o direito, se não for conforme com a busca do bem, não é senão uma técnica sofisticada, capaz até de perpetrar injustiças?

            A ética integra a Filosofia, que não pode percorrer, errática, as sendas de um racionalismo neutral, suscetível de radicalizar o subjetivismo e o empirismo cético, quando abandona as incontestáveis certezas da natureza humana.

            No presente estágio da vida social, em que a verdade é vilipendiada e reveste as mais inesperadas formas, a ética seria o antídoto à disseminação da mentira. Não a mentira caridosa, de quem pretende esconder ao enfermo terminal sua real condição. Mas a inverdade interesseira, com vistas à obtenção ou perpetuação de vantagens as menos decorosas.

            Paradoxal o curso da humanidade, a desvendar mistérios, a aprimorar a ciência e a extrair dela tecnologias que produziram profunda mutação na sociedade, mas em acelerado retrocesso ético. No estudo da ética e na prática ética.

            Os antigos – ou nem tão antigos assim – podem nos inspirar. Em sua clássica obra “A Verdade na Moral e no Direito”, Giorgio Del Vecchio assinala: “Conhecer significa tender para a verdade e compreendê-la. E o que é a verdade? Reside em nós, fora de nós, ou nos dois lugares a um tempo?”.

            Responder a essa indagação nos poderá fazer enxergar o quão nociva é para a humanidade, perdida em egoísmo e alheia ao que se passa fora de sua órbita estrita de interesses individualistas, a expulsão da ética das cogitações dos que têm a obrigação de estudar a cada dia, para minorar a aflição dos injustiçados.

            Alguém vislumbra a recuperação do interesse pelas supremas verdades éticas, que deveriam residir em nossa mente em caráter de necessidade, eternidade e universalidade? Ou continuaremos atentos às aparências efêmeras, vítimas das mutáveis impressões fabricadas por não se sabe quem, nem com que interesse?

_ José Renato Nalini é Reitor da UNIREGISTRAL, docente da Pós-graduação da UNINOVE e Presidente da ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS – 2019-2020.

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