Blog do Renato Nalini

Ex-Secretário de Estado da Educação e Ex-Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo. Atual Presidente e Imortal da Academia Paulista de Letras. Membro da Academia Brasileira de Educação. É o Reitor da UniRegistral. Palestrante e conferencista. Professor Universitário. Autor de dezenas de Livros: “Ética da Magistratura”, “A Rebelião da Toga”, “Ética Ambiental”, entre outros títulos.


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Desafios para 2015

O ano próximo apresentará um quadro preocupante para a economia brasileira. 2014 foi o ano da Copa, era preciso acenar com o Brasil Maravilha para elevar a autoestima doméstica e propiciar um bom espetáculo aos estrangeiros. Encerrado o festival – e tudo funcionou adequadamente – vieram as eleições e agora chegou a hora da verdade.

Tudo indica uma estagnação da atividade econômica, uma recessão, um crescimento quase negativo do PIB. Entretanto, é preciso reagir. Passos importantes foram dados para a inclusão financeira de nacionais que eram praticamente invisíveis, integrando a economia informal. Agora é preciso consolidar a inclusão desses 40 milhões de usuários do sistema. Qualificar os serviços. Ampliar o leque de funcionalidades. Treinar para uma educação financeira responsável, pois o incluído nem sempre atua com sensatez e se endivida, aumentando a inadimplência e gerando crise interna e externa.

As PPPs, Parcerias Público-Privadas devem ser estimuladas. O Estado não tem recursos financeiros para atender a todas as demandas. Aqueles empresários que sobreviveram à exagerada volúpia e ao excessivo apetite da voragem fiscal devem colaborar para incrementar as atividades lucrativas. As pequenas e médias empresas devem ser estimuladas, para que persistam na geração de empregos e passem a integrar o mercado formal.

O crescimento brasileiro há de ser sustentável. Como diz IVES GANDRA, o Estado não cabe no PIB. Temos uma inflação acima do desejável e nada indica próxima queda de seus índices. Impõe-se um realinhamento de preços e de tarifas. O Estado precisa ser mais responsável e gastar menos. Todos os gastos devem ser redimensionados e o enxugamento não pode ser descartado. Um bom início seria acabar com a propaganda institucional, quase sempre a disfarçar um personalismo que é nefasto. Seja porque exaure o Tesouro com investimentos em publicidade eleiçoeira, seja em virtude de disseminar um hábito que em nada contribui para o aperfeiçoamento da Democracia tupiniquim.

Na verdade, 2015 será um ano difícil. É melhor que nos preparemos. Quem continuar como avestruz ou fazendo o jogo de Polyana, vai se assustar com o quadro que se avizinha.

JOSÉ RENATO NALINI é presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo para o biênio 2014/2015. E-mail: jrenatonalini@uol.com.br.


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Quem acredita em quem?

O Poder Judiciário merece apenas 32% de credibilidade, conforme pesquisa levada a efeito pela Fundação Getúlio Vargas em 2013. Está longe das instituições mais prestigiadas da República: Forças Armadas em primeiro, Igreja Católica em segundo e Ministério Público em terceiro. Paradoxalmente, o Brasil caminha para o absurdo número de 100 milhões de processos em curso por todos os 91 Tribunais da República.

Não é incrível que, aparentemente, menos de um terço da população tenha fé na Justiça e a procure de maneira crescente e incessante? Para reabilitar a crença na Justiça muito há a ser feito. Primeiro, disseminar a cultura da pacificação. Litigar não é a solução. Conciliar é legal. Por quê? Porque a população precisa aprender a conversar a respeito de seus direitos e de suas obrigações.

Não pode se acostumar com a transformação de todos os problemas, todas as questiúnculas, em volumosos processos judiciais. Todos sabem como começam as ações em juízo: escancarou-se o acesso à Justiça, a partir da Constituição de 1988, pródiga em direitos. Mas agora está difícil encontrar a saída. Nas quatro instâncias e nas várias dezenas de possibilidades de recorrer, reside a causa da duração infinita e indefinida de qualquer processo.

A segunda luta é investir na gestão. É preciso pensar em produtividade, em fazer mais com menos, em racionalizar, adotar estratégias espertas e eficazes. Nisso ainda há um longo caminho a percorrer. A terceira meta – e a mais difícil – é a mudança de mentalidade. Até o momento, prepondera o pensamento maximizante. Ou seja: quanto mais juízes, quanto maior o número de funcionários, melhor. Não é assim.

Para um crescimento saudável de uma instituição cujo gigantismo a conduzirá ao caos ou à insustentabilidade, é preciso recrutar adequadamente seus quadros funcionais. A partir do juiz, que no futuro precisará ser um arquiteto de edificação de soluções concertadas. Não basta sentenciar: mais importante é chegar ao ponto ótimo em que a solução seja legitimada pelo consentimento dos partícipes.

A Justiça convencional exerce uma função pedagógica: ela sinaliza qual deve ser a leitura do direito vigente. Orientará a sociedade a administrar o justo concreto de maneira direta, mais simples, mais eficaz, mais rápida e menos dispendiosa. É o sonho de quem acredita que o Judiciário pode ser muito melhor do que hoje.

JOSÉ RENATO NALINI é presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo para o biênio 2014/2015. E-mail: jrenatonalini@uol.com.br


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O futuro do direito

O Brasil possui mais Faculdades de Direito do que a soma de todas as demais, existentes no restante do Planeta. A cada semestre, milhares de bacharéis recebem o seu diploma e esperam absorção no mercado de trabalho. Ambiente saturado para quem não tiver uma formação muito especializada, com credenciais para o enfrentamento de questões que passam ao largo do ensino jurídico.

O desafio é ultrapassar o conhecimento jurídico. Quem se contentar com as disciplinas clássicas estará condenado a não encontrar um nicho garantidor da sobrevivência. Para quem estiver antenado ao que acontece no mundo e observar as necessidades do mercado, esse terá futuro. Talvez algumas pistas sirvam para a reflexão dos futuros bacharéis.

A informatização é irreversível, tanto na vida privada como na administração pública. O domínio dessas tecnologias da comunicação e informação é essencial. Até as crianças hoje são desenvoltas no manuseio desses equipamentos eletrônicos que, aos poucos, vão facilitando a vida comum. Outro ponto a merecer consideração é a proficiência em mais de um idioma.

O monoglota é alguém privado de se comunicar com o mundo civilizado. Principalmente quando ele só se exprime em Português. O inglês é hoje obrigatório. Mas ganha ponto quem puder falar também alemão e mandarim. O advogado será cada vez mais um consultor de negócios, especialista em prevenir acidentes jurídicos, sempre frequentes para quem explora atividades na empresa privada.

O direito penetrou na vida de cada um de maneira tão intensa, que é comum encontrar profissionais de outras áreas que a necessidade empurrou para o aprendizado jurídico. Um Estado que ocupa mais lugar do que deveria, que se intromete em tudo e que é um sorvedouro crescente dos nossos ganhos, precisa de limites. Estes só podem ser opostos pelo Direito. Ferramenta que, bem utilizada, consegue resolver problemas e que, manejado por incompetentes, vai causar prejuízos irreparáveis.

Os jovens precisam ter consciência de que o diploma é mera condição para um exercício profissional que pode ser promissor para o corajoso, desalentador para alguém que possui limites superáveis apenas por ele próprio. Mudar a vida é resultado de desejo firme e vontade inabalável. Ingredientes que estão dentro de nós e que ninguém consegue introjetar se não quisermos ou não deixarmos.

JOSÉ RENATO NALINI é presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo para o biênio 2014/2015. E-mail: jrenatonalini@uol.com.br.


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Acabar com as injustiças

Ainda existe muita injustiça no mundo. Não sei como os pósteros chamarão nossa era. Mas não poderão louvar uma civilização que acaba com a natureza, que produz lixo à vontade, que polui água, ar, mar e terra. Uma sociedade que convive com pessoas ocupando as ruas, que pede pena de morte e redução da maioridade, que tranca indiscriminadamente as pessoas, impulsionando a indústria de construção de presídios.

Uma sociedade que acha normal a corrupção, que se serve da propina para conseguir benefícios, grandes ou pequenos. Um povo que perde a batalha contra a droga e condena a sua juventude à morte precoce, por não oferecer perspectivas reais de ser feliz. Quem não se indigna com uma educação ineficiente, com aulas sem atrativo para uma infância/juventude cada vez mais mal educada, quem perdeu a polidez, o berço e as posturas, talvez não enxergue o retrocesso que as fotos comprovam. O que já fomos, em cotejo com o que somos.

Nenhum desses problemas será resolvido por milagre. Mas jamais serão resolvidos se perdermos nossa capacidade de indignação. Se um grupo ao menos não os considerar ultrajantes e solúveis. E se não resolvermos encarar o desafio de humanizar a humanidade.

É uma questão que envolve fé. É óbvio que a crença é algo admirável. Mas para mudar o mundo, é preciso um novo tipo de fé. A fé de que os seres humanos têm capacidade de se preocupar com os sofrimentos alheios e que, por isso, mostrar a verdade é a receita para fazer as pessoas agir. Há coisas que precisam ser bem conhecidas para serem detestadas. Cada um de nós deve tirar a venda dos olhos dos que não enxergam ou não querem ver.

Encarar a realidade como ela é e como poderia ser, mostrar a infâmia de uma civilização que não se incomoda com os valores, que encara insensível tudo o que acontece de ruim – e com a nossa conivência – é obrigação de cada pessoa que não perdeu a sensibilidade. É impossível não ser tomado de “santa ira” ao prestar atenção àquilo que ocorre diante de nossos olhos. Uma Nação que teria tudo para ser exemplo e é motor de tristeza para a maioria de seus filhos.

Enquanto houver indignação haverá esperança. Esta só morrerá quando o último dos homens se convencer de que a humanidade não tem remédio.

* JOSÉ RENATO NALINI é presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo para o biênio 2014/2015. E-mail: jrenatonalini@uol.com.br


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Quem quer ser advogado?

“Conquistar o diploma de bacharel em Direito é mais fácil do que ser dentista, farmacêutico ou agrimensor. Isso, porém, acontece porque nada é mais difícil do que aprender o Direito… O paradoxo é apenas aparente. Para que o bacharel deixasse a faculdade habilitado a advogar ou a julgar, seria necessário que para ali entrasse muito jovem e saísse encanecido… Durante os cinco anos do curso acadêmico, o futuro advogado ou magistrado somente adquire – o que não é pouco – pela convivência dos mestres e por influência das tradições da casa e da vida universitária, o “espírito de jurista”, que o dominará durante toda a existência, imprimindo-lhe no coração e na consciência o amor à lei e à justiça. Da Ciência Jurídica, porém, o melhor estudante apenas levará para a vida prática algumas noções genéricas e um pouco de método, para estudá-la aqui fora. Alguns, realmente, estudam”.

Esse texto não é meu. Foi escrito pelo legendário Ministro Manoel da Costa Manso, ao apresentar o livro “Da Tentativa”, escrito pelo Juiz de Direito de Campinas Vasco Joaquim Smith de Vasconcellos, em 1932. Herdei o livro da maravilhosa biblioteca do Desembargador Young da Costa Manso, que foi Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, assim como seu pai. E que judicou em Jundiaí na década de quarenta do século passado.

Mas como são atuais as palavras do ministro Costa Manso, que foi Juiz em Casa Branca e de lá guindado ao Tribunal de Justiça de São Paulo, que presidiu e depois chegou ao Supremo Tribunal Federal. O Curso de Direito é mera formalidade. Quem realmente quer ser advogado precisa ser um insatisfeito. Não se conformar com a matéria de classe, mas se aprofundar em pesquisa individual, servir-se do professor para elucidar dúvidas que encontrar no estudo que é um exercício solitário. Quem se satisfizer com as aulas será sempre alguém limitado. Pois a plenitude do conhecimento nunca esteve tão disponível. O Google elucida todas as dúvidas. Mas não ensina a pensar. Isso é missão de cada um. E não se aprende na Faculdade. 

O Brasil começa a enxergar e logo mais exigirá um outro bacharel em ciências jurídicas: alguém provido de aptidão para conciliar, para pacificar, para harmonizar. Não para litigar! Quem se aperceber disso terá futuro. Os outros, o tempo dirá…  
 
* JOSÉ RENATO NALINI é presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo para o biênio 2014/2015. E-mail: jrenatonalini@uol.com.br.
 
Ministro Manoel da Costa Manso / fonte: http://www.stf.jus.br

Ministro Manoel da Costa Manso / fonte: http://www.stf.jus.br