Blog do Renato Nalini

Ex-Secretário de Estado da Educação e Ex-Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo. Atual Presidente e Imortal da Academia Paulista de Letras. Membro da Academia Brasileira de Educação. É o Reitor da UniRegistral. Palestrante e conferencista. Professor Universitário. Autor de dezenas de Livros: “Ética da Magistratura”, “A Rebelião da Toga”, “Ética Ambiental”, entre outros títulos.

Vieira e o Boca do Inferno

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Mencionei outro dia Gregório de Matos, que foi juiz e sacerdote, que incursionou poeticamente por nossa mestiçagem mística e erótica, dos desejos, fracassos, alegrias, ilusões, sofrimentos e prazeres, como observou Adriano Espínola. Seu contraponto é o Padre Antonio Vieira. Este na prosa, aquele na poesia. Ambos no século XVII, proclamaram a sua verdade. Não havia mídia, não havia literatura. Só oralidade. Um pregava os seus sermões. O outro declamava suas poesias.

Ambos, porém, influenciavam a conduta dos contemporâneos. Vieira para elevar as almas ao céu. Gregório de Matos para mantê-los vinculados à exuberância, aos apelos e à luxúria da terra. Os dois eram paradoxalmente temidos e admirados. Tiveram de responder à Santa Inquisição, pois geniais. Não hesitavam em afrontar os poderosos e denunciavam falsidade e erro, má conduta e pecado.

Cada qual privilegiava um lado das naturais aspirações humanas. A salvação eterna para uns, o prazer sensual para outros. Em síntese, é ainda Adriano Espínola quem observa, “ambos compartilham barrocamente da mesma danação do verbo e da mesma indignação diante do desconcerto do mundo”.

E o mundo continuou desconcertado. Alguém já encontrou a “era do ócio” prometida para este Século XXI? Onde a paz, a tranquilidade, o tempo de lazer multiplicado, pois as máquinas fariam tudo e nós teríamos oportunidade de exercitar o prazer. Senão com exclusividade, ao menos a maior parte daquilo que nos foge e aceleradamente quando estamos mais próximos à despedida: o tempo, que nos conduz à morte.

Faltam vozes corajosas como as de Gregório de Matos e de Antonio Vieira. Há muita gente a palrar, mas ninguém quer ouvir. Cada qual se embevece com o som da própria voz. A volúpia do excesso de informações deixa a consciência em turbulência permanente. Todos estamos com a cabeça cheia, mas desarrumada. Quando o essencial é ter uma cabeça organizada, embora não repleta.

Gregório, o “boca do inferno”, Vieira, o “boca do céu”, se completavam porque ofereciam o cotejo entre opiniões bem fundamentadas. Hoje a algaravia é a regra, ninguém se entende, cada um fala o que lhe vem à mente e não há mais profetas. A indigência moral da criatura que se considera racional superou todos os parâmetros. Quem devolverá a razão ao ser humano?

JOSÉ RENATO NALINI é presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo para o biênio 2014/2015. E-mail: jrenatonalini@uol.com.br.

Imagem: edição assessoria (fonte: http://www.onordeste.com/ e http://www.buscatematica.net/)

Imagem editada assessoria (Fonte: http://www.onordeste.com e http://www.buscatematica.net)

Autor: Renato Nalini

Ex-Secretário de Estado da Educação e Ex-Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo. Presidente e Imortal da Academia Paulista de Letras. Membro da Academia Brasileira de Educação. Atual Reitor da UniRegistral. Palestrante e Conferencista. Professor Universitário. Autor de dezenas de Livros: “Ética da Magistratura”, “A Rebelião da Toga”, “Ética Ambiental”, entre outros títulos.

4 pensamentos sobre “Vieira e o Boca do Inferno

  1. Presidente, peço vênia para discordar.
    Não penso que o Brasil esteja dividido entre Gregório de Mattos e o Padre Antonio Vieira.

    Começo a notar que a vontade de enfrentar os desafios de temas mais sensíveis como a reforma política, a maneira como vem sendo encaminhado o processo de correção de rumo em nossa economia, e, vejo no horizonte a longo prazo, talvez não venha a presenciar tal realidade, mas quero dizer que os rumos de nosso nação estão sendo corrigidos.

    Dois são os eventos que assisti que me emanaram deste otimismo momentâneo, aliás três, foram três entrevistas que assisti na televisão, dois são personagens otimistas inerentes, que passaram exatamente esta idéias de esperança de dias melhores: o ex-Governador Dr. Paulo Salim Maluf (Na Veja Digital) e o ex-Ministro Dr. Delfim Netto ( na RedeTV), e, uma entrevista na Bandeirantes, Canal Livre, com o Filósofo Luiz Pondé

    Estou vivendo este momento breve de otimismo o qual me faz acreditar que não estamos tão ruim assim, até existe esta torre de babel, mas talvez em uma dimensão menor, e que as pessoas, apesarem de divergirem umas das outras, estão escutando e buscando, independente de suas diferenças, elas estão encontrando seus caminhos próprios, de felicidade, de amor ao próximo, de convivência, e, realização pessoal.

    Assim sendo, peço vênia, para acompanhar os votos de Luiz Pondé, Paulo Maluf e Delfim Netto.

    E para terminar, gostaria de citar uma frase de Vossa autoria, que bem expressa o direito de sonhar, de esperança de dias melhores, de não desistir, e de lutar sempre: “É Utopia? Talvez. Mas tirem-me tudo. Menos a capacidade de sonhar e a esperança de dias melhores…Sem isso não se consegue suportar a vida.” (Presidente do TJSP, Renato Renato Nalini).

    Minha Utopia é a de que se este Brasil dividido existe, mas ele está com os dias contados, pois, ainda que eu não esteja aqui para ver, pois será uma construção de longo prazo, tenho certeza que viveremos dias de grandes conquistas, de grandes glórias e muitas vitórias.

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  2. Perfeito: “Todos estamos com a cabeça cheia, mas desarrumada. Quando o essencial é ter uma cabeça organizada, embora não repleta.”

    Talvez o foco no essencial, é o que tem nos faltado. Entendê-lo mais, sem se entregar de corpo e alma ao desenvolvimento, tornando-nos escravos de tanta modernidade, sem o equilíbrio necessário ao alcance da verdadeira felicidade.

    A verdade é que tem faltado paz, mas sobrado desassossego, seguidos de reclamações por conta de nossas frustrações. Mas o que fazemos? Aceitamos participar da corrida desenfreada dessa época, sem sabermos ao certo, se o troféu ganho, não será mera ilusão aos nossos olhos, ou se realmente valerá a pena tanta bagagem pesada no transcorrer dessa estrada, já que a vida é curta, e talvez, poderíamos melhor preenchê-la.

    Se lá proclamavam a sua verdade, e não havia mídia ou literatura, mas só oralidade; talvez justamente por isso, ambos eram ouvidos e melhor compreendidos de seus fundamentos. Hoje a bagunça é grande!

    Antes se ouviam mais, mas sejamos justos, a atenção era de alguma forma exclusiva a isso ou aquilo. Também se conversavam mais… Quando visitámos, íamos e sentávamos um de frente para outro, e conversávamos. Hoje, chegamos em um ambiente, e temos que dividir nossa atenção com uma tv, celulares e computadores. Há muita informação, mas pouco foco e disposição em ir além da poluição que hoje experimentamos em diversas questões da vida.

    “HD” lotado, escutam sem escutar, e repetem criticando por aí. Estamos pilhados! Queremos praticidade em tudo. Vejo grupos por todas as partes. Escolhem lados, criam rótulos e são incapazes de ouvirem as verdades dos que rotulam como oposição. Sim, do lado de lá, também deve existir alguma verdade; ao menos deveríamos analisar, não?

    Ontem uma pessoa se dirigindo a mim, disse: ahh se todos fossem igual a vc Mimi! Eu sem entender, disse: não entendi. Ela: há muita gente falsa neste mundo. Você nunca foi falsa ou tentou me enganar escondendo uma verdade. Eu: cuidado! O que é falsidade? O que é enganar? Por vezes saio com um sorriso falso, e distribuindo a todos. E isso acontece, pois sou humana e tenho meus dias ruins e por vezes, me sinto uma palhaçada, me maquiando para esconder as minhas dores e saio por trás de um sorriso cá e lá… Não gosto de distribuir o meu fardo por aí, prefiro distribuir um sorriso… Mas, vai que eu não consiga convencer a alguém, e seja pega em meu sorriso amarelo? Vai que essa pessoa, ache que é pessoal? Continuei… Confesso a ti, que por vezes, nem escuto o que outro me fala, e estou com a cabeça tão cheia e um coração tão triste, que só sorrio e vejo o rosto da pessoa que fala comigo. É aí, como vc me julgaria? O que importa às vezes, não é o que vc diz que ele fez para ti, mas se realmente fez, pq agiu dessa forma. Isso explicará muitas coisas. Evitará muitos equívocos. E melhor, sempre será um segundo olhar. Um terceiro ou quarto se for preciso. Ouvir mais. Debater mais. Tentar entender, antes de uma classificação negativa.

    Agora as máquinas, essas nos ajudam, mas, não somos gratos a elas ou nos contentamos com o seu valor. Queremos mais! Quanto mais praticidade melhor. Nascemos em meio ao desenvolvimento, e queremos mais! Como esperar um mês para que a costureira termine o meu vestido como acontecia no tempo de meus bisavós? Por falta de opção, eles viviam tranquilos aquela realidade da época. Treinavam demais o esperar e a gente, a sermos rápidos!

    Hoje parece um absurdo ter que comprar o tecido. Depois ir atrás de uma renda que bem orne. Depois botão, depois… Depois… Ãn?! Tudo pronto, e em 30 minutos de caminhada num shopping, saímos com o look completo em mãos. E quando a compra é feita pela internet? Ansiosos esperamos pela transportadora/correio. Aprendemos a não esperar, e o pior, que tolerar é regressar, e bem não devemos aceitar; somos máquinas!

    Queremos que o que nosso dia seja cada vez mais melhor aproveitado, mas não com o essencial, mas com o maior número de tarefas. Queremos fazer mais em menos tempo. Ninguém nos ensinou a nos desenvolvermos sem se torna-mos ansiosos em meio a tanta tecnologia. Vivemos acelerados, e o pior, como não alcançamos nossas expectativas inalcançáveis, frustramos e nos deprimimos. Aí vem o desânimo e uma preguiça sem fim de viver a real realidade, e muitas doenças da alma que hoje assistimos por aí.

    Eu comentando de uma receita de bolo, uma amiga ouvindo disse: vc ainda faz esses bolos simples também? Hoje a moda é comprar nessas casas de bolos caseiros. São baratos e realmente caseiros. E eu, quase me convenci. Realmente o custo é baixo. Devem ser em conta, só cobrando a mão-de-obra e tal… O sabor não é industrializado. Não sujamos louças, mas decidi analisar melhor qual era realmente graça do meu bolo.

    Lembrei que nos fds, vamos eu com meu irmãozinho de 11anos, sobrinha de 13 anos e filha de 18 anos. Lá, eu distribuo as tarefas de acordo com a idade. Brincamos, disputamos quem vai raspar as panelas, potes com recheios e massas… Rimos. Aguardamos ansiosos (ansiedade gostosa) sentindo o cheirinho do bolo. Lavamos a bagunça juntos, cooperando e ensinando da responsabilidade, que a vida não é só feita de alegrias, mas que podemos pôr alegria em tudo, e achei a graça de tudo. Talvez comprar, poderia alimentar, mas não teria o mesmo sabor mesmo com um bom sabor.

    Hoje vamos no mercado, e o comércio te oferece de um tudo. As crianças não sabem o que comer. Temos que ensinar. Há de um tudo, e tudo tentador! Comidas caseiras estão cada vez mais em extinção. Congelados ou vamos para um restaurante. E a delícia que é cozinhar para família, visita?

    Sem equilíbrio, comprometemos demais às relações humanas. Máquina alguma é capaz de consertar às relações humanas em desalinho. Como substituir o amor ao próximo. Hoje a internet tem sido o instrumento de fulga de muitas almas carentes. Mas se desligarmos a tv, rádio, internet de um ambiente repleto de pessoas, o que sobrará a todos? Se relacionar! Conhecer a história de cada um olhando nos olhos, sem textos bonitos maquiados para as redes sociais, e com disposição e tempo de entender a estrada passada por cada um.

    Esses dias a Eletropaulo realizou manutenção de postes e fiquei sem luz em pleno sábado. Bom, fds para mim é de muito trabalho em casa. Faço à ‘Amélia’ e depois a mulher contemporânea. rs. Cozinho, lavo, passo, faxino o apto., e depois, vou cuidar de mim, do estrago das unhas unhas, pelo, cabelo etc. Bom, e como cumprir minhas tarefas sem luz? Não lavei. Não aspirei. Fui cozinhar e percebi que estava sem fósforo pra ligar o fogão. Com acendedor automático, esquecemos. Não passei. E tudo que propunha fazer, e necessitava de luz, ia me irritando, ao invés de me acalmar e selecionar as tarefas que davam, esquecendo do cronograma oficial. Acabou que fiquei da 9:00 às 14:00 hs irritada. Pouco fiz neste tempo, a não ser ter raiva e pensar no futuro – em todas as tarefas acumuladas! E do que valeu fazer à perturbada? Rs. Deveria ter posto um shorts e camiseta e descido para o PQ do lado de casa. Sabia o horário que a luz voltaria, mas preferi sofrer reclamando, rs. E Como me dei conta? Depois, ligando pra pai (único que me “guenta” rs.), e desorientada como se tivesse perdido um prazo que resultaria na morte de alguém, ele rindo, me acalmou fazendo-me enxergar da realidade, e pedindo que não levasse as obrigações tão a sério e deixasse de ser metódica como sempre sou. Desliguei mais calma. Alguém ouviu o meu desabafo, e correspondi ouvindo também. Desliguei o celular e fui bater um bolo à mão. Acendi o forno com o fósforo. Fiz o café manual e adocei minha vida! rs. A faxina ficou para o domingo… rs.

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    • Oi Camila, sempre inspirada!
      Viu como é fácil acender uma vela em vez de amaldiçoar a escuridão rs.
      …ao alcance da verdadeira felicidade….. veja o que encontrei como marcador de texto num livro que estou lendo:

      DEVOLUÇÃO:

      Queres felicidade. Felicidade, porém é uma construção a fazer. O alicerce está em ti mesmo. Recorda: terás sempre o que deres de ti. O retorno é de lei. Ainda mesmo que em migalha, distribui a esperança e a alegria. Mesmo sofrendo, oferece um sorriso aos outros. Tanto quanto puderes, faze os outros felizes. Pouco a pouco, terás centuplicadamente aquilo que semeias. Não te esqueça: felicidade é devolução.

      Emmanuel – Francisco Cândido Xavier do Livro: Sinais de Rumo – Edição: GEEM

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      • Bom dia Sr. ariovaldo.
        Sim, não diria inspiração, mas não acho o ponto final em meu teclado, e lá vou abrindo o coração e despejando o meu português ruim. rs.

        Sim, sim… Venerar a escuridão lá no meu caso. Dar maior importância as coisas sem importância. Mas, venho me policiando por esses meus 34 anos de vida. Adoro uma agenda, um tudo certinho… Um tem de se feito… É aí, cobrança comigo. Entendo bem os outros, mas não permito muitas coisas. Sou exigente comigo. Aff! rs. Mas acho que tenho jeito… De vez enquanto, em minha autossuficiência em diálogo, me ponho no lugar, e boicoto algumas tarefas só para provar que o mundo não acabará se eu não cumpri-la, rs

        Que linda mensagem. Não a conhecia. Grata por dividir conosco.
        Um bom dia e semana ao senhor.
        Que o Criador lhe acompanhe em suas atividades.
        Abraço a ti e família.

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